Dieta Comportamental Rogério Coelho - Revista Reformador
“A Educação e a oração, constituem o equilibrado cardápio de luz que alimenta e plenifica o Espírito.” – François C. Liran
Somos, ao mesmo tempo, receptores e emissores de energia. Lançamos ao nosso derredor forças criativas ou destrutivas, agradáveis ou desagradáveis. À semelhança da aranha, estamos presos à própria teia das criações mentais a que damos origem. Daí afirmar Emmanuel:
Nossos pensamentos são paredes em que nos enclausuramos ou asas com que progredimos na ascese.1
Já dizia Jesus: “Onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração”,2 portanto, movemo-nos ao talante do nosso arbítrio íntimo. Destarte, só lograremos atingir o desiderato assinado pelo Pai a todas as criaturas, isto é, a perfeição e felicidade sem mescla, se conseguirmos nos elevar, com todos os elementos de nossa órbita, aos alcandorados sítios da Espiritualidade superior. Alteiam-se, aí, dois propulsores da ascese: a oração e a educação. Enquanto a oração nos dá o norte, a direção, portanto, a esperança, conectando-nos com os mananciais superiores da inspiração, a educação ensejará a difícil lapidação das arestas da intimidade psíquica, facultando ao Espírito em evolução a obediência, a resignação, a confiança e a perseverança que o auxiliarão a seguir, sem desvios – intimorato e intemerato – o roteiro esboçado pelo Mais Alto.
A prece [adenda Emmanuel] traduzindo aspiração ardente de subida espiritual, através do conhecimento e da virtude, é a força que ilumina o ideal e santifica o trabalho. [...] o culto à prece é marcha decisiva.3 A educação [diz Joanna de Ângelis] é o processo de adaptação aos superiores degraus da Vida espiritual para onde se segue.4
Por ancestral atavismo – remanescente da longa demora nos abissais sítios do instinto ainda estamos “encharcados” das induções primárias. Faz-se, pois, mister efetuar ingentes esforços para nos desembaraçarmos das teias vigorosas desses impulsos menos felizes, para que o crescimento em Espiritualidade venha a ser o corolário natural dessas batalhas íntimas.
A educação como ciência e arte de vida
À Educação está entregue a grave e árdua tarefa de desenvolver as tendências positivas ínsitas no Espírito e corrigir as inclinações malsãs que deságuam em quedas de vária ordem. Após milenares períodos de experiências palingenésicas, a própria vida tornou-se uma Escola de Reciclagem, onde – de observação em observação – o Espírito aprende a discernir o que é melhor ou pior para si mesmo, auxiliando-o no estabelecimento de um quadro de valores, de que se pode utilizar para a tranquilidade interior. Como ninguém é uma ilha, o isolacionismo não realiza criatura nenhuma. A sociedade se torna, então, educadora por excelência, ao oferecer as suas características gregárias. Por tudo isso, assiste toda razão a um “Espírito Amigo” ao afirmar:
O Evangelho é, quiçá, dos mais respeitáveis repositórios metodológicos de educação e da maior expressão de filosofia educacional. Não se limitando os seus ensinos a um breve período da Vida e sim prevendo-lhe a totalidade, propõe uma dieta comportamental sem os pieguismos nem os rigores exagerados que defluem do próprio conteúdo do ensino.
Quando os mecanismos da educação falecem, não permanece o aprendiz da Vida sem o concurso da evolução, que surge como dispositivo de dor, emulando-o ao crescimento com que se libertará da situação conflitante, afligente, corrigindo-o e facultando-lhe adquirir as experiências mais elevadas.
Os hábitos que se arraigam no corpo, procedentes do Espírito como lampejos e condicionamentos, retornam e se fixam como necessidades, sejam de qual expressão for, constituindo uma outra natureza nos refolhos do ser, a responder como liberdade ou escravidão, de acordo com a qualidade intrínseca de que se constituem.
Imperioso, portanto, conforme propôs Jesus, que se faça a paz com o “adversário enquanto se está no caminho com ele”,5 vez que, amanhã, talvez seja muito tarde e bem mais difícil alcançá-lo. O mesmo axioma se pode aplicar à tarefa da educação: agora, enquanto é possível, moldar- -se o eu, antes que os hábitos e as acomodações perniciosas impeçam a tomada de posição, que é o passo inicial para o deslanchar sem reversão.6
Neste mundo de escarcéus, onde as procelas físicas e morais tendem a fazer malograr os esforços sintonizados com as faixas do bem, aprendamos a orar e a valorizar a educação, tendo ambas – oração e educação – como bagagens indispensáveis que deverão sempre nos acompanhar, conduzindo-nos com segurança através das veredas marcadas por aquele que é “o caminho, e a verdade, e a vida”. (João, 14:6.) Daí, inspiradamente, versar Auta de Souza:
Todo anseio da crença acalma as dores, Toda prece é uma luz para quem chora, A oração é o caminho cor de aurora Para o sonho dos pobres pecadores!...
Referências 1XAVIER, Francisco C. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed. 4. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2011. Cap. 149. 2MATEUS, 6:21. 3XAVIER, Francisco C. Fonte viva. Pelo Espírito Emmanuel. 36. ed. 4. reimp. Rio de Janeiro: FEB. 2011. Cap. 149, p. 368. 4FRANCO, Divaldo P. SOS família. 4. ed. Salvador: LEAL, 1984. 5MATEUS, 5:25. 6FRANCO, Divaldo P. SOS família. 4. ed. Salvador: LEAL, 1984. 7XAVIER, Francisco C. Parnaso de além-túmulo. 19. ed. 2. reimp. Rio de Janeiro: FEB, 2010. Vinde!, p. 33. .
Consumismo: da necessidade ao desejo
Pesquisadora espírita explica como o processo tomou conta da vida de muitos brasileiros
Religião, mas também ciência e filosofia. A combinação tríplice tem feito do Espiritismo o caminho trilhado por muitos brasileiros que querem uma vida mais significativa. Não só porque – como alguns leigos possam pensar – busca respostas para o que há depois da morte, mas sobretudo porque divulga valores que melhoram a vivência na Terra.
Talvez por isso o Espiritismo esteja presente na vida de tantas pessoas. Hoje, o Brasil tem a maior comunidade espírita do mundo. De acordo com o IBGE, já é a terceira religião em número de adeptos no país.
Na Sociedade Brasileira de Estudos Espíritas (SBEE), os temas trabalhados por Allan Kardec são contextualizados e fomentam diversas pesquisas desenvolvidas por seus médiuns.
A publicitária Janaina Merhy decidiu estudar a fundo a visão do Espiritismo em relação ao consumismo. Na pesquisa que vem desenvolvendo, ela busca estabelecer as principais diferenças entre a satisfação adquirida com a posse e a felicidade conquistada com o autoconhecimento. O trabalho resgata desde as informações recebidas pelas crianças, passando pela influência da internet na vida dos adolescentes, até as desilusões e frustrações de adultos que para compensar o vazio – que poderia ser suprido com autoconhecimento – investem seu tempo em compras. “A falta de identidade pessoal, de elaboração de valores e ideologia de vida próprios pode estar por trás do consumo excessivo ou do constante querer coisas e frustrar-se por não tê-las. Dessa forma tentamos construir, com o consumo, a identidade que nos falta. Fazemos com que as coisas digam o que somos por não sabermos fazê-lo, por falta de autoconhecimento”, explica.
A pesquisadora, que é professora de Comportamento do Consumidor na Universidade Tuiuti do Paraná, preocupa-se com as dimensões que o consumismo tem tomado: “A questão do consumo há muito tempo ultrapassou os limites da necessidade e alojou-se no campo do desejo.” Ela ressalta em seu trabalho que o consumo é necessário - alimentação e vestuário precisam ser comprados - mas o problema, segundo Janaína, é a inversão de valores. Segundo ela, “o problema não é o consumo consciente, equilibrado e coerente com o padrão social e poder aquisitivo, até mesmo porque o consumo não pode ser extinto de nossas vidas. Problemático e frustrante é não ter outros valores além dos que se pode comprar, criando preocupações desnecessárias.”
De acordo com Janaína, nem mesmo os relacionamentos escapam do hábito do consumo. A preocupação excessiva com a estética acarreta distanciamento dos valores realmente importantes numa troca entre pessoas. “‘Coisificando-nos’ estamos consumindo o outro. O sociólogo Zygmunt Bauman usa a expressão ‘amor líquido’, bastante poética para o significado que carrega. Realmente parece que os laços afetivos se liquefazem, consomem-se. Sem os laços que nos unem às outras pessoas nos tornamos seres sozinhos e vazios.” A publicitária conclui que, como num ciclo vicioso, mais uma vez, os consumistas são lançados às compras, para tentar compensar essa ausência. “Momentaneamente os objetos resolvem a angústia sentida, liberando hormônios que nos fazem sentir bem, mas logo em seguida tropeça-se em angústia e vazio ainda maiores”, lembra Janaína.
De acordo com a pesquisa, o Espiritismo promove o autoconhecimento e desperta senso crítico, fundamentais para quem não quer cair nas armadilhas criadas pela publicidade. “Com a análise hermenêutica, do desenvolvimento do pensamento crítico, sobre o que nos cerca, sobre os conceitos, ideologias e práticas repetidas em nosso cotidiano, podemos combater o dogmatismo em nossas vidas e na sociedade como um todo”, pondera a pesquisadora.
“Conforme vamos sedimentando nossa identidade em valores espirituais, dignificantes e sólidos, questionando-nos, conhecendo-nos, vamos nos sentindo mais plenos e fortes, cada vez mais imunes aos apelos consumistas típicos de nossa época. Aos poucos colocamos nosso desejo a serviço do nosso ser, de nossa construção íntima, a serviço do próximo e de todo o planeta, desenvolvendo um profundo sentimento de pertencimento à humanidade”, conclui Janaína.
Para saber- Hermenêutica: Expressão de um pensamento; explicação e, principalmente, interpretação do mesmo.